Ilegitimidade do tabelião interino para responder por dívida
AGRAVO INTERNO EM Agravo de Instrumento Nº 5xxxxxx-xx.2023.8.21.7000/RS (TIPO DE AÇÃO: Seguro)
EMENTA:: AGRAVO INTERNO EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL. ILEGITIMIDADE DO TABELIÃO INTERINO PARA RESPONDER POR DÍVIDA DECORRENTE DE PLANO DE SAÚDE COLETIVO DESTINADO À SERVENTIA. FUNÇÃO DELEGADA EXERCIDA EM NOME DO ESTADO QUE NÃO SE EQUIPARA AO EXERCÍCIO PELO TITULAR DA SERVENTIA. responsabilidade DO ENTE PÚBLICO. PRECEDENTES. DECISÃO MONOCRÁTICA MANTIDA. NEGADO PROVIMENTO AO AGRAVO INTERNO.
RELATÓRIO
Trata-se de agravo interno interposto por XXXXX-MEDICA LTDA. contra a decisão monocrática do evento 16, DECMONO1, que deu provimento ao agravo de instrumento interposto por PARTE AUTORA-XXXX (TABELIÃO INTERINO) contra a decisão que, em ação de execução de título extrajudicial contra ele proposta pela ora agravante interno, rejeitou exceção de pré-executividade (evento 32, DESPADEC1).
A autora agravante alega, em resumo, que o “não há que se falar em ilegitimidade passiva do tabelião interino Parte Autora (Tabelião Interino) para responder pela execução, uma vez que, como já demonstrado nos autos, foi quem celebrou o contrato de prestação de serviços de saúde com a XXXXX-MEDICA LTDA.”. Sustenta que “o tabelião é o responsável pelos atos realizados no tabelionato e, ainda que houvesse entendimento em sentido contrário, o contrato foi firmado com o seu nome, sua assinatura, contraindo todas as obrigações do respectivo contrato”. Pede o provimento do agravo interno para “negar provimento ao recurso interposto pelo executado, mantendo a decisão que rejeitou a exceção de pré-executividade apresentada, nos termos da fundamentação exposta” (evento 31, AGRAVO1).
O agravado apresentou contrarrazões (evento 41, CONTRAZ1).
É o relatório.
VOTO
O caso trata de execução de contratos de assistência à saúde coletivos empresariais nos modelos “Unipart” e “Unimax, celebrados em 25/05/2018 e 01/04/2018 (evento 1, CONTR4 e evento 1, CONTR5) entre a exequente XXXXX-MEDICA LTDA. e o executado XXXX-TABELIÃO INTERINO, então Tabelião interino do Xº Tabelionato de Notas de Porto Alegre.
O executado apresentou exceção de pré-executividade alegando ser ilegítimo para responder à execução, pois não era titular da serventia, exercendo a atividade de forma interina, em razão do afastamento do titular.
A alegação foi rejeitada pelo juízo de origem, por meio da decisão ora agravada, com o seguinte teor: “[…]. Considerando que os títulos em execução referem-se a despesas contraídas durante o período de administração do opoente, possui este responsabilidade em suportar a sua totalidade a partir do ingresso das receitas obtidas com a prestação do serviço delegado. […].”.
Em seu agravo de instrumento, o agravante executado alegou, que não detém legitimidade para responder pelo pagamento dos títulos executados (plano de saúde coletivo contratado para o Cartório), pois exerceu a serventia de forma interina, em função de intervenção do Estado pelo afastamento do titular da serventia, que respondia a processo administrativo. Aduziu que durante a interinidade, a responsabilidade pelos atos praticados pelo interino designado é do Estado interventor. Referiu que o vencimento dos títulos executados ocorreu após o término da sua administração provisória, devendo ser direcionada a execução para o atual interino da serventia. Cita os TEMAS 777, 779, 940, 1.130 e 1.140 do STF. Pediu o provimento do recurso para acolher a exceção de pré-executividade.
Ao agravo de instrumento foi dado provimento pela decisão monocrática objeto deste agravo interno, no qual a parte contrária reafirma a legitimidade do executado para responder pela dívida.
Considerando que as questões aduzidas neste agravo interno já foram tratadas no julgamento monocrático, estou mantendo aquela decisão e submetendo o julgamento do recurso ao Colegiado, a saber:
[…]. Da análise dos autos, constata-se que o agravante exerceu interinamente a serventia a entre 07/02/2018 (evento 24, PORT5) e 07/02/2022 (evento 24, PORT6).
Embora a contratação do plano de saúde tenha sido realizada pelo executado (25/05/2018 e 01/04/2018), assim o fez na condição de agente estatal interino e em nome do Estado, não se equiparando aos titulares de serventias extrajudiciais, que exercem a serventia em nome próprio.
Tanto é assim que, respondendo interinamente pela serventia, o executado teve sua remuneração limitada ao teto constitucional, com a obrigação de recolher aos cofres públicos o valor excedente, tal como se vê na portaria de designação (evento 24, PORT4 e evento 24, PORT5):
IMAGEN-XXXX
Não há como exigir do Tabelião interino que arque pessoalmente com as despesas do Cartório, quando a receita do mesmo Cartório não lhe são destinadas livremente.
A questão ligada a forma de atuação do agente notarial interino foi tratada pelo STF no julgamento Recurso Extraordinário n. 802.202 — Tema n. 779, assim ementado:
DIREITO CONSTITUCIONAL. NOTÁRIOS E REGISTRADORES. TITULARES E SUBSTITUTOS. EQUIPARAÇÃO. INVIABILIDADE. INTELIGÊNCIA DOS ARTS. 37, INCISO II; E 236, § 3º, DA CF/88. REMUNERAÇÃO DOS INTERINOS DESIGNADOS PARA O EXERCÍCIO DE FUNÇÃO DELEGADA. INCIDÊNCIA DO TETO REMUNERATÓRIO DO ART. 37, INCISO XI, DA CF/88. OBRIGATORIEDADE. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
- Os substitutos ou interinos designados para o exercício de função delegada não se equiparam aos titulares de serventias extrajudiciais, visto não atenderem aos requisitos estabelecidos nos arts. 37, inciso II; e 236, § 3º, da Constituição Federal, para o ingresso originário na função.Jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal.
- Diferentemente dos titulares de ofícios de notas e registros, que se classificam como agentes delegados, os substitutos ou interinos de serventias extrajudiciais atuam como prepostos do Estado e se inserem na categoria genérica dos agentes estatais,razão pela qual se aplica a eles o teto remuneratório do art. 37, inciso XI, da Carta da República.
- Tese aprovada: “os substitutos ou interinos designados para o exercício de função delegada não se equiparam aos titulares de serventias extrajudiciais, visto não atenderem aos requisitos estabelecidos nos arts. 37, inciso II; e 236, § 3º, da Constituição Federal para o provimento originário da função, inserindo-se na categoria dos agentes estatais, razão pela qual se aplica a eles o teto remuneratório do art. 37, inciso XI, da Carta da República.” 4. Recurso extraordinário provido.
(RE 808202, Relator(a): DIAS TOFFOLI, Tribunal Pleno, julgado em 24-08-2020, PROCESSO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL – MÉRITO DJe-279 DIVULG 24-11-2020 PUBLIC 25-11-2020)
Em caso análogo, este Tribunal também já decidiu:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. PROCESSUAL CIVIL. ILEGITIMIDADE PASSIVA DO DEMANDADO. TABELIÃO INTERINO. TEMA 779 DO STF. SENTENÇA TERMINATIVA CASSADA. NECESSIDADE DE OPORTUNIZAÇÃO À PARTE AUTORA DE CORREÇÃO DO POLO PASSIVO. Os delegatários interinos são designados em caráter precário, passando a atuar na condição de prepostos do Estado, submetido ao teto constitucional, sendo impositivo o recolhimento do excedente. isso porque a tese do tema 779 DO STF refere que mediante a vacância da delegação o serviço extrajudicial reverte ao Estado, até a novo provimento por delegatário aprovado em concurso público. Sendo assim, efetivamente, a demanda direcionada contra o Tabelião interino não pode prevalecer, considerando ser parte ilegítima para o pleito de indenização deduzido na exordial.APESAR DE NÃO SER O CASO DE DENUNCIAÇÃO DA LIDE, Alegando o réu, na contestação, ser parte ilegítima ou não ser o responsável pelo prejuízo invocado, o juiz facultará ao autor, em 15 (quinze) dias, a alteração da petição inicial para a substituição do réu. Por outro lado, o art. 317 do CPC prevê que o juiz antes de extinguir o processo, sem solução de mérito, deverá oportunizar a parte, se possível, corrigir o vício. LOGO, NÃO É O CASO DE AUTOMÁTICA EXTINÇÃO DO PROCESSO, SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO.NESSE CONTEXTO, DEVE SER DESCONSTITUÍDA A SENTENÇA RECORRIDA, PARA QUE SEJA OBSERVADO O DISPOSTO NOS ARTIGOS 338 E 339 DO CPC, COM A CORREÇÃO DO POLO PASSIVO DA DEMANDA. RECURSO PARCIALMENTE PROVIDO.(Agravo de Instrumento, Nº 5xxxxxxxx20228217000, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Eduardo Kraemer, Redator: Tasso Caubi Soares Delabary, Julgado em: 07-12-2022).
Nesse contexto, impõe-se o reconhecimento da ilegitimidade passiva do executado.
ANTE O EXPOSTO, dou provimento ao recurso para, acolhendo a exceção de pré-executividade, declarar a ilegitimidade passiva do tabelião interino executado. […].
ANTE O EXPOSTO, voto por negar provimento ao agravo interno.
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Fonte: TJRS.