O ISSQN dos Oficiais de Registro e Tabeliães designados interinamente

O ISSQN dos Oficiais de Registro e Tabeliães designados interinamente

Atualmente existem 2 regimes jurídicos que disciplinam o vínculo dos Oficiais Registradores e Tabeliães com o Estado:

  1. Concurso público: delegação definitiva do serviço notarial/registral ao aprovado em concurso público de provas e títulos (art. 236 da Constituição Federal);
  2. Designação interina: vigora no caso de vacância de uma serventia. Até que novo concurso público seja realizado, o estado membro, por meio do Poder Judiciário, designa interinamente um profissional para responder pelo serviço público (Resolução CNJ 80/2009, Art. 3º).

Quanto à remuneração pelos serviços prestados, os concursados têm como remuneração o valor do faturamento da serventia, subtraídas todas as despesas (folha de pagamento, tributos, aluguel, despesas de manutenção, etc). Não há limite para a remuneração destes profissionais.

Para os designados interinamente, por sua vez, atualmente vigora um limite para a remuneração, independentemente da receita auferida pela serventia. A remuneração não pode ultrapassar o teto constitucional do serviço público, que corresponde a 90,25% do subsídio dos Ministros STF, conforme regulamentação expedida pelo CNJ (com base no art. 37, XI da CF). O que exceder este teto, é repassado ao Tribunal de Justiça do estado.

No que diz respeito aos tributos, e mais especificamente ao ISSQN, uma parte do grupo dos designados interinamente, a nosso ver, está sofrendo tributação indevida.

Para a correta compreensão do tema, é preciso subdividir o grupo dos designados interinamente em dois:

  • os designados interinamente para as serventias com receita mensal superior ao teto constitucional (90,25% do subsídio dos Ministros do STF), e
  • os designados interinamente para as serventias com receita mensal inferior a esse teto.

Embora a tributação seja indevida para os dois subgrupos, em tese, os únicos prejudicados são os do grupo “b”, ou seja, os designados interinamente para as serventias cuja receita não excede o teto remuneratório.

Primeiro explico porque, em tese, o tributo não é devido. Não é devido pela incidência do princípio constitucional da Imunidade Recíproca.

Esse princípio está previsto no artigo 150, VI, a, da CF. Em síntese, determina que um ente federativo (os Estados membros, por exemplo) são imunes em relação aos Impostos cobrados por outro ente federativo (os Municípios, por exemplo).

Para completar o raciocínio, é preciso partir da premissa de que o titular das serventias designadas é o estado membro da federação, e não o profissional que foi escolhido para prestar os serviços interinamente. O serviço permanece nas mãos do Estado, que apenas aloca um agente interino para responder por tais serviços. Pode substituí-lo a qualquer momento, e além disso, o Poder Judiciário do estado exerce o pleno controle das receitas e despesas da serventia designada, o que reforça ainda mais esse entendimento.

A título de exemplo, o profissional designado interinamente não pode sequer contratar um novo funcionário, ou fazer qualquer despesa não recorrente (reforma, mudança de endereço, etc), sem a autorização do Tribunal de Justiça a que está vinculado.
É inegável, portanto, que o profissional designado é um “funcionário” do Estado.

Diante dessas circunstâncias, não deve incidir ISSQN sobre os serviços prestados pelas serventias designadas, sob pena de ofensa ao principio constitucional da Imunidade Recíproca.

A situação ganha relevo em relação aos profissionais das serventias designadas cuja receita não supera o teto constitucional (90,25% do subsídio dos Ministros do STF). Este grupo representa a imensa maioria dos designados, pois tais serventias são as localizadas nos pequenos municípios.

Embora o titular da serventia seja o Estado, eles é que vêm sofrendo a indevida tributação. Ou seja, estão sendo obrigados a recolher o tributo (cuja alíquota varia conforme a legislação de cada município), sem que o Estado tenha interesse em fazer cessar a cobrança indevida, embora seja o titular do serviço.

Afinal, que interesse terá o Estado em fazer cessar a tributação indevida, se não obtiver nenhum ganho financeiro? Lembre-se que nestes casos, nenhum valor é repassado ao Estado, pois a receita da serventia não ultrapassa o teto.

Diferente é o que ocorre com as serventias designadas cuja receita ultrapassa o teto constitucional da remuneração dos servidores públicos. Nestes casos, por autorização do CNJ, o profissional designado abate o ISSQN recolhido da receita bruta, antes de repassar o excedente da receita ao Estado. Em outras palavras, o ISSQN não é descontado da sua remuneração. Quem arca com a tributação é o próprio estado membro.

Obviamente, nestes casos, o estado membro tem sim interesse em fazer cessar a tributação indevida. Mas isso é assunto para os Procuradores do Estado, e não para os profissionais designados interinamente dessas serventias.

Diante desse cenário, é possível visualizar ainda a ofensa a outro princípio do direito tributário: o Princípio da Isonomia (CF, art. 150, II). Ou seja, há um tratamento desigual entre profissionais que se encontram em situação equivalente. Ambos são designados interinamente para o exercício do mesmo serviço público, mas uns são tributados, e outros não.

Em síntese, a nosso ver, os profissionais designados interinamente para as serventias cuja receita não ultrapassa o teto constitucional (90,25% do subsídio dos Ministros do STF), estão sendo tributados indevidamente, no que diz respeito ao ISSQN.

A boa notícia é que é possível pleitear na justiça a cessação da cobrança indevida, além da devolução do que foi pago indevidamente nos últimos 5 anos. Já existem precedentes judiciais reconhecendo este direito nos estados do Rio Grande do Sul, São Paulo e Paraná.